Seguidores google+

sexta-feira, 13 de março de 2020

OS INTERESTADUAIS DE 1906 - 1916 - 20º E 21º JOGOS

 20º e 21º jogos — Mackenzie x Botafogo e Paulistano x Botafogo. — Datas: 2 e 3 de Maio de 1915. — Local: S. Paulo - Resultados: Mackenzie, 2x1 e Empate, 0x0. 

Em começos da temporada de 1915, antes de iniciado o campeonato carioca, o Botafogo, com o seu quadro todo desfalcado excursionou a S. Paulo, onde não ia desde 1911, enfrentando em dois dias sucessivos, os fortes quadros da A. Mackenzie e do C. A. Paulistano, excursão assim descrita por "Jornal do Comércio"

“A visita feita pelos sportmens do Botafogo a S. Paulo, longe de corresponder  a pessimistas esperanças, foi um desmentido formal ao conceito, talvez fundado, que se fazia daquele club. Nem todos sabiam que a veterana rapaziada do campeão de 1910 seria capaz de enfrentar a galhardia dos jogadores paulistas, achando-se, como corria a boca pequena, em más condições de organização e apuro. E quando se noticiou aqui o Botafogo que o Botafogo  seguia para S. Paulo, sem Mimi, sem Rolando e sem o seu simpático center-half, o Dr. Luiz Rocha, desvaneceu-se de uma vez a espectativa que ainda perdurara nos amigos do club ,de poder êle defender o nome respeitável que conquistou justamente aos brilhantes scores marcados em São Paulo. Tôdas as opiniões desconfiantes eram, como se acaba de verificar, antecipadas. O Botafogo, em São Paulo, se não se portou a altura de anos anteriores, levantando duas vitórias, deve exclusivamente ao imprevisto da "força maior", porque se lá estivesse Mimi, acentuando o ataque do club carioca, outro teria sido o resultado que, ainda como foi, é bastante lisongeiro para um team recentemente organizado. Nos dias em que jogou, achava-se desfalcado dos elementos com os quais devia ser representado, pois que contra o Mackenzie, a sua parelha de backs foi Carlitos e Dutra, em vez de Dutra e Joppert, e, ao segundo dia, contra o Paulistano, apresentou-se sôbre essa falta, ainda a ausência de Juca, center-half, e Vadinho, inside left, substituídos por Caldas e M. Pinto. Não obstante os desfalques sensíveis, para quem conhece a influência de Lulú e o peso de Mimi, na linha de ataque, o goal da veterana sociedade esportiva, ia experimentar a defesa de Cesar Gonçalves, que se ensaia presentemente nas fileiras de um primeiro team. Contra essas dificuldades injustas, surgia à frente do Botafogo, o melhor team de São Paulo a equipe do Mackenzie, reforçada com elementos do Corintians Club, hoje pertencente à Associação Paulista, entre elas Casemiro, o keeper que o Rio conhece, e o Club A. Paulistano, dirigido pelo valoroso Rubens Salles, que hoje representa, segundo a opinião local, a supremacia do football no Brasil. Perfeitamente aguerridos, tendo já experimentado os embates dos primeiros matches de campeonato, os dois clubs paulistas iam se apresentar contra o Botafogo em situação muito favorável, primeiro porque iriam submete-lo a uma estréia rigorosa, segundo, pela razão de guerrea-lo depois, já em segunda mão. 

O match contra o Mackenzie foi um belo torneio. Possuidor de uma equipe homogenea, onde se salientam as figuras de Zecchi e Osny, dois simpáticos sportsmen e cavalheiros distintos, o club alvi-negro, provi anel campeão paulista, enfrentou galhardamente o seu rival carioca, fazendo-o recuar ao primeiro momento. A linha de forwards atirou-se sôbre a defesa do Botafogo corno uma avalanche. Perigava o goal carioca a todo o instante. Mas uma investida segura do Botafogo transformou subitamente a sua ofensiva. Registrara-se um corner contra o Mackenzie. Batidos por Villaça, veio a bola ter aos pés de Juca, que não pôde dirigi-la em goal, porque havia um jogador do Mackenzie dificultando-lhe o arremesso. Juca, então, calmamente, passa-o a Jones, que marca o primeiro goal, ficando êsse score mantido durante todo o primeiro half: e mais metade do segundo, quando se registrou o primeiro ponto dos paulistas. 

Cesar, que brilhara em magnificas defesas, achava-se, porém, nessa ocasião visivilmente contrariado. É que, contrastando com o cavalheirismo paulista, e esquecivel grupo de mal educados, dirigia-lhe gracejos pesados por detraz do goal. E foi tal o vexame que lhe impuzeram, que o goal-keeper carioca abandonou o seu posto para vir solicitar providências do Sr. Godinho, referee. Foi o desastre. Logo depois, mal havia Cesar retornado o seu posto, como uma bala, atravessando o campo, num shoot vigorosissimo, uma bola enviada por Zecchi, vasava o goal do Botafogo, onde o seu keeper havia chegado ao tempo junto de lhe fazer face, reassumindo assim em ocasião critica a sua posição, pois, deslocado, não pôde evitar que os paulistas marcassem o goal que veio desfazer o empate. Quasi depois findava o match com a vitória do Mackenzie pelo seara de 2x1.

No team carioca, todos se tendo portado bem, mesmo Vadinho, a quem a emoção toldara os primeiros shoots, salientou-se, entretanto, o seu goal-keeper Cesar, que se tinha revelado prematuramente um forte baluarte na defesa do Botafogo. Por esta ligeira cronica verifica-se que fatores externos ao valor do team influiram desastradamente sôbre o resultado do jogo que, felizmente, não podia ter deixado na fidalga sociedade paulista senão a boa impressão que se testemunhava nos entusiasticos aplausos da assistência. 

Contra o Paulistano, apresenta-se o Botafogo sem o seu center-half da vespera, substituído, então, por Villaça. Estava assim o seu team constituído: Cesar; Carlitos e Dutra; Caldas, Villaça e Coió; M. Pinto, Aluizio, Jones, Menezes e Gagá. O ataque coube ao Botafogo, e dessa vez acentuou-se por tal maneira que não foi difícil prever, seria êle o primeiro a abrir o score. Rubens, porém, multiplicava-se. Ora auxiliava o ataque, ora a defesa. A assistência, já acostumada ao pavoroso kick do half paulistano, aguardava anciosa o ponto inaugural, marcado indefectivelmente de 30 jardas, pelo festejado foot-baller. Villaça, entretanto, vigiava-o; Carlitos e Dutra o espreitavam de longe, e Menezes, muitas vezes, burlou a proficiência do terrível campeão, passando por êle para chegar à frente do goal ambicionado.

Cesar, que ainda contra o Paulistano manteve o seu valor da vespera, defendendo uma formidável cabeçada, a três jardas, respondeu a um fortissimo shoot de Rubens, deixando a arquibancada perplexa e quasi desesperançada de ver infalível goal do primoroso footballer internacional. 

Corria assim o tempo, sem que os adversários, conquistassem outras vantagens, além de vários corners que surgiam como último recurso, para encher de ancia uma assistência inteira. Apenas digno de registro, nesse match que se jogava com a máxima lisura, apezar da pouca experiência do referee, o Sr. Lagreca, visionário de offsides, ressalta a impetuosidade do ataque do Botafogo, cuja linha, organizada numa situação dificil, se atuava valentemente sabre seu valoroso rival, pondo o goal paulista em perigo. Não lograram, porem, os forwards cariocas marcar uma merecida vitória. 

O Paulistano possue uma excelente defesa, definindo-se na presença de Rubens Salles e Orlando, um infatigável back. ]

Não fôsse a desvantagem provocada pela marcação sistemática de off-sides de jogador, hoje bania no Rio, por certo o desmentido que o Botafogo pôde oferecer aos seus prematuros juizes, seria mais palpitante. Nós, entretanto, não esqueceremos jamais o esforço que o valente club dispendeu em São Paulo, tendo partido daqui numa atmosfera de desconfiança e receio, para voltar esperançado ao encontro de seus rivais que são agora os incompreensíveis. 

Na recepção feita aos sportsmen cariocas, entre os quais figurava o presidente da Liga Metropolitana, o Dr. Zamith, a  máxima cordialidade presidiu tôdas essas manifestações de boa camaradagem, realizando-se dois banquetes no Hotel d'Oeste, nas noites de 2 e 3 de maio. Com a presença dos representantes da Associação Paulista, de vários sportsmen de clubs de S. Paulo e da imprensa, serviu-se variado "menu", sendo ao "desert", trocados varios brindes. 

Os jogadores do Botafogo voltaram pelo 1º noturno de ante-ontem, em carro especial ligado ao trem da carreira, tendo feito magnifica viagem. Todos eles confessam-se gratissimos pelas gentilezas recebidas em S. Paulo e mesmo confundidos com o modo fidalgo com que foram tratados pelos sócios dos clubes da Associação Paulista. 

Foram os seguintes os sportmen fluminenses que estiveram em São Paulo: Dr. Alvaro Zamith, presidente da Liga Metropolitana de Sports Atléticos; Joaquim de Souza Ribeiro e Dr. Augusto P. Fontenelle, presidente e secretário do Botafogo; Cesar Gonçalves, Carlos M. Rocha, Edgard Dutra, Tenente Carlos Villaça, José Couto, Jorge Martins, Octaviano Caldas, Mario Pinto, Luiz Menezes, Albert Jones, Aluizio Pinto, Edgard Pessoa, O. Pessoa, Hydarnés Widal e Gurgel Dantas. Estiveram hospedados no hotel d'Oeste, onde realizaram várias conferências e reuniões tendentes a solucionar a debatida questão da fusão da Liga com a Associação Paulista, motivo este que levou o Dr. Zamith a capital paulista. Em conversa que teve com os sportsmen fluminenses disse o Sr. Rubens Salles reconhecer no Mackenzie o provavel Campeão paulista dêste ano. Fez elogios ao jogo desenvolvido pelo clube carioca em ambos os matchs, mesmo levando em consideração o fato de achar-se a sua eleven desfalcada do extraordinário Mimi e haver jogado com elementos do segundo team". 

NOTAS — De fato, o Glorioso desfalcado dos consagrados Rolando, Lulú e Miriti, com Villaça deslocado para médio e com Juca Pinto impossibilitado de enfrentar o Paulistano, brilhou com os seus bravos elementos do segundo quadro que, aliás, seriam os vencedores do torneio de 1915. Carlito Rocha, Caldas, o inesquecível Mário Pinto e o valoroso Vadinho, que fez a sua estréia. Carlito Rocha, então, o nosso grande Carlito, foi um revelação brilhante, como se vê desses topicos da imprensa paulista, sôbre o jogo contra o Mackenzie: — "Na defesa da sociedade fluminense, merece especial mensão o Sr. Carlos Rocha, que se portou admiravelmente. Na sua posição de center-halff, desfez quasi sempre, com muita habilidade, a boa combinação de forwards do team local. Estava em tôda a parte: quando o goal do Botafogo se achava em perigo, lá se se via êle a atrapalhar os seus contendores que a cada passou ameaçavam fazer pontos". — "As outras investidas fracassaram devido ao preciso trabalho de Carlos Rocha, que foi a alma da defesa carioca".  Foi êste o quadro que enfrentou o Mackenzie: Cesar; -Carlito e Dutra; Villaça, J. Couto e Coió; Menezes, Aluizio, Jones, Vadinho e Gagá.  No quadro do Mackenzie brilhou o grande zagueiro Osny Werner que, no ano seguinte, mudando-se para o Rio, passou a defender o Botafogo em cujas cores se integrou definitivamente. 

—O primeiro ponto do Mackenzie foi marcado por Oscar de Almeida.   O saudoso Rubens Salles, e a quem Luiz Menezes deu tanto trabalho, era considerado o primeiro jogador do Brasil, maximé após sua inesquecível façanha de 27 de setembro de 1914, quando em Buenos Aires, com o seu terrível tiro de quarenta jardas, venceu para o Brasil a primeira disputa da Copa Roca (1x0). Embora nele não figurassem alvi-negros, julgamos interessante relembrar o selecionado que deu essa grande vitória ao Brasil e que foi o seguinte: Marcos; Pindaro e Nery; Lagreca, Rubens e Pernambuco; Oswaldo Gomes, Bartolomeu, Milon, Friedenreich e Arnaldo. Essa vitória, juntamente com as obtidas sôbre os inglêses do Corintians e do Exeter-City, que relembramos no número anterior, constitue a maior façanha do nosso football passado.  Lulú Rocha foi o emulo do extraordinário Rubens Salles, tendo dominado-o amplamente no celebre match da taça "Rio-São Paulo", oferecida pelo "Correio da Manhã" e realizado a 3 de outubro de 1915 no antigo campo do Fluminense; quando o selecionado carioca impoz sua maior vitória do passado ao paulista, sempre melhor treinado e organizado, os inesquecíveis 5x2, pontos de Menezes 2, Welfare 2 e Sidney 1, para os cariocas e de Formiga e Hopkins para os paulistas. Lulú Rocha, cuja inclusão no scratch fôra criticada pela imprensa, que já o considerava "passado", assombrou, tendo eclipsado o terrivel Rubens. Anos mais tarde, palestrando conosco no trem de Petrópolis, Lulú explicou-nos sua façanha, dizendo-nos que, sendo muito mais alto do que Rubens e percebendo que êste combinava matematicamente rasteiro com os médios de ala, em largas passadas, Lulú cortava-lhe os passes e ia para deante, tornando-se o dono da cancha. Foram êstes os selecionados que se defrontaram: 

Cariocas — Marcos; Pindaro e Nery: Rolando, Lulú e Galo; Menezes, Sidney, Welfare, Mimi e Sylvio.

Paulistas — Casemiro; Morelli e Osny: Lagreca, Rubens e O. Egydio; Formiga, Demostenes, Nazareth, Mac Lean e Hopkins. Rolando, Lulú, Mimi e Menezes, quatro das maiores glorias do Botafogo, inscreveram seus nomes neste grandioso feito sendo que Luiz Menezes, então um garoto, impoz-se nesta tarde memorável, definitivamente, como um dos maiores atacantes brasileiros. Perfeito em qualquer posição do ataque, bastando considerar que no momento atuavam como centro avante de nosso quadro, jogador velozissimo, possuidor de violento tiro, mestre nos passes e driblings, Menezes marcou dois goals impressionantes, tendo aberto e fechado a contagem carioca. 

                                                  Alceu Mendes de Oliveira Castro 

Acervo particular Alceu Oliveira Castro Junhgsted

Fonte: Boletim Oficial do BFR nº 91 de abril de 1950

-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-


Nenhum comentário:

Postar um comentário