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sexta-feira, 13 de março de 2020

OS INTERESTADUAIS DE 1906 - 1915 - 22º e 23º JOGOS

 OS INTERESTADUAIS DE 1906 - 1916 

22º jogo - Palmeiras x Botafogo. — Data: 22 de Agosto de 1915. Local: S. Paulo. Resultado: Botafogo, 2x1. 

Esta grande vitória botafoguense, obtida sôbre o forte esquadrão que seria o campeão invicto de S. Paulo, em 1915, foi assim descrita pela "A Noticia": — "O Botafogo derrotou brilhantemente o Palmeiras pelo score de 2 a 1. Por nós termos chegado com atraso, devido à demora do correio, publicamos fora da secção respectiva a nossa correspondência de São Paulo: ---- O Velódromo apresentava anteontem um aspecto deslumbrante e uma animação fora do comum. Muito chic, todo embandeirado, as arquibancadas sem um lugar para uma mosca, repletas de tudo o que de mais fino há na elite paulista. Em redor da arena aglomerou-se uma multidão colossal de espectadores, os indefectiveis torcedores, que às vêzes, com os seus berros punham os próprios jogadores às tontas, e, diga-se de passagem, o Botafogo conta inúmeras simpatias entre nós. 

Os que ante-ontem compareceram ao gramado da rua Constelação, poucas ocasiões terão de assistir a um tão magnifico encontro, como foi essa grande prova estadual. Os dois clubes desenvolveram um jôgo assombroso, seguro, cheio de precisão, e cada qual rivalisando em valor o adversário. Ainda mais, tanto os players do Botafogo, como os do Palmeiras, portaram-se com uma delicadeza bastante significativa. 

Se a memoria não nos falha, analisando esse encontro, falamos o seguinte no nossa número de sábado: "Não sabemos ao certo se a equipe carioca se tem submetido a trainings, mas isso é mais que provável, tratando-se de um club do valor do Botafogo, que vai medir fórças com um adversário da qualidade do Palmeiras! Temos até um certo palpitesinho  sôbre o desfecho dêsse match..." E o nosso palpitesinho venceu. O Botafogo alcançou a mais brilhante vitória que po-eria desejar; e alcançou-a de um modo completo, absoluto e muito honrosamente. 

O Botafogo apresentou em campo um conjunto de 11 jogadores, muito capaz de enfrentar com vantagem qualquer team de S. Paulo ou Rio. Foi simplesmente admirável o jogo desenvolvido pela equipe carioca. A principal figura foi, incontestávelmente, o center-half, Lulu, que nessa posição joga mais do que três Rubens Salles juntos. Lulu jogou assombrosamente, tanto na defesa como no ataque, distribuindo passes de maneira estupenda, eficazmente auxiliado por Vil-aça e Coió. Rarissimas eram as ocasiões em que os forwards do Palmeiras conseguiram passar esse trio incomparável. Quando isso acontecia, iam esbarrar em Wigand  e Dutra, segunda barreira do team. Na linha de ataque salientaram-se o magnifico Mimi, Menezes e Jones. Gagá e Aluizio também estiveram bons e cavaram a valer. O Palmeiras jogou como de costume, e isto é tudo. Atacou valentemente, defendeu-se o melhor que pôde, mas o osso desta vez era um tanto duro de roer, e depois... êste Botafogo tem sido fatal ao team da Floresta... De nada lhe valiam os ataques cerrados que levava a efeito de tempos á tempos. Onde a bola ia ter, la surgia na frente Lulú, que jogou de back, half e forward, interceptando de modo seguro os passes feitos pelo inimigo. O jôgo teve inicio com cargas impetuosas levadas a efeito pelo Botafogo, as quais punham às tontas os bravos rapazes do Palmeiras. Êsses ataques, que se sucediam sem cessar, tiveram logo completo êxito. Uns sete minutos depois de iniciado o jôgo, Menezes recebendo um ótimo passe de Jones e estando bem colocado, envia pavoroso shoot ao retângulo do Palmeiras, conseguindo vazá-lo sob estrepitosas aclamações do numeroso público. Rachou nem chegou a esbarrar na bola. Dai em diante o Palmeiras empregou titânicos esforços para anular essa vantagem, á que, deu ocasião a que Lulú, Villaça, Coló, Dutra e Wigand, mostrassem o seu valor. A linha carioca, por sua vez, punha em polvorosa a defesa contrária, tendo perdido boas ocasiões de aumentar o score. E o resto da primeira fase de tempo terminou sem que fôsse mareado qualquer outro ponto. A segunda fase, certamente, a mais empolgante do dia. O Palmeiras fez desesperados esforços para desfazer a vantagem adquirida pelos cariocas, e consegui-o sepois de 20 minutos.  Em certa ocasião  Barbosa, de posse da bola dá um centro alto. Breno apodera-se da mesma, e longe arrisca um kick, indo a esfera bater na trave superior e, dai, não sabemos como, resvalou no braço sie Hydarnés indo aninhar-se na réde. Esse feito foi furiosamente aplaudido pela enorme massa de espectadores e espectadoras, que se acotovelavam nas arquibancadas. No ar só se viam chapéus, bengalas, etc. Como resposta tôda a linha do Botafogo, eficazmente auxiliada pelos halves, inicia uma série de ataques maravilhosamente combinados, aos quais a defesa do Palmeiras é impotente para conter. Como conseqüência, uns dez minutos depois do feito de Breno, Jones recebendo um bom passe de Aluizio, corre velozmente com a bola, e da linha de corner desfere violento shoot. A bola bate no canto esquerdo do retângulo e vencendo a vigilância de Rachou, vai pela segunda vez aninhar-se na réde de adversário. E estavam os cariocas novamente com a vantagem e a vitória garantida, pois faltavam apenas quatro minutos para terminar o jôgo. Esse espaço de tempo decorreu sem novidade, terminando, portanto, o belíssimo match com o seguinte resultado: Botafogo, 2, goals, Palmeiras, 1 goal. Os teams apresentaram-se assim formados: 

Palmeiras — Rachou; Lefevre e Merelli; Hugo, Octavio e Gilberto; Meirehe, Barbosa, Nazareth, Demostenes e Breno. Botafogo — Hydarnés; Wigand e Dutra; Villaça, Lulú e Coió, Jones, Aluizio. Menezes, Mimi e Gagá. O juiz, Sr. Hutchinson, jogou como um juiz de verdade e basta". 

23.° jogo - Botafogo x Palmeiras  — Data: 7 de Setembro de 1915. Local: Rio. Resultado: Palmeiras, 2x1. 

Foi assim descrita a revanche do campeão paulista: "A entrada da representação paulista foi coroada com entusiasticos aplausos, que se repetiram quando a equipe se apresentou no campo, pronta para a luta, seguida do sr. Alberto Borgerth, juiz escolhido para presidi-la. O team do Palmeiras apresentou-se "an grand complet". Era o seguinte: Rachou; Morelli e Lefevre; Hugo, O. Egydio e Gilberto, Meireles, Demostenes, Nazareth, Breno e Ralo. Quanto ao Botafogo, estava desfalcado de C. Villaça que teve que partir para São Paulo. A equipe era, portanto esta: Hydarnés, Wigand e Dutra; Rolando, L. Rocha e J. Martins; Jones, Aluizio, Menezes, Benjamin e Pessoa. Antes de entrarmos na resumida descrição do desenrolar da partida, digamos alguma coisa sôbre as equipes e seus componentes. A do Palmeiras, que pela primeira vez nos visitava este ano, estando cercada de grande fama cá entre nós pelo excepcional papel que vem fazendo no campeonato de S. Paulo, revelou-se digna do conceito em que a temos. Possue uma defesa muito forte, homogênea, em que se salienta uma magnifica linha de halves. A atividade, vigilância e inteligência de jôgo que esta linha média demonstra é de se fazer notar. Já não nos queremos referir a O. Egydio, nosso velho conhecido, cujos predicados estão mais que comprovados, citaremos os seus dois outros companheiros, Hugo e Gilberto, jovens cujas aptidões para as suas posições de ala são extraordinárias. O ataque é também de primeira ordem. De ponta a ponta os que o compõem calham perfeitamente nas subdivisões que lhe são destinadas. Entretanto, Demostenes, se bem que ao lado de dois insides valiosos, é o guia das investidas e a primeira figura da linha. Revela-se de uma precisão invejável na distribuição das bolas e é incansável no ânimo que inou-te aos demais atacantes, escareando-os a todo o momento das acometidas, ajudando-os material e moralmente. Em conjunto, o grupo é harmônico e a coordenação que atesta trae o grande treino que deve possuir. Pratica o verdadeiro association, sem exibições pessoais, com o intuito constante de valorizar o conjunto e trabalhar por ele. Dão a parecer que se acham convitos de que é a A. A. das Palmeiras que joga e não cada um déle em sua posição para os olhos do público. Esta qualidade, que se apresenta à primeira analise, como crucial; é rarissima nas equipes do nosso campeonato. Ainda ontem a ofensiva do Botafogo foi regularmente prejudicada com a pratica do jôgo pessoal desenvolvida em seu núcleo, Aluizio, notadamente, excedeu-se em atos de tal natureza, pretendendo, sempre que se apossava da esfera, caminhar com ela até o goal contrário, esquecendo-se de que sua tarefa seria muito mais facilitada e não afetada em seu êxito, se êle reparasse nos seus companheiros bem colocados e com êle partilhasse. Passando ao nosso Botafogo, não nos é licito deixar de prestar, "In primo loco", uma fervorosa homenagem. Esse preito é dedicado a Benjamin Sodré a quem coube uma tarde de glória, digna de ser mencionada na vida esportiva do célebre — celebre na extensão da palavra jogador nacional. Manteve-se durante tôda a contenda de modo admirável, não tendo perdido um unico dos lances que durante ela intentou. Esteve realmente estupendo! Para O. Egydio foi um trabalho insano marcar o agil e imperturbável forward, ao passar por tôdas as brechas, a inventar saídas quando elas por acaso não existiam, puxando verdadeiramente os restantes atacantes. Revelou-se a alma das suas cores. — "Mimi está mesmo em ponto de bala...!" — disse-nos alguém ao lado, exprimindo pitorescamente a ação de Benjamin. O mais infeliz do ataque foi Pessoa. Ainda no segundo meio-tempo logrou reerguer-se um -pouco. No primeiro, porém, não acertou uma única passagem. As linhas de defesa portaram-se a contento. Não aguentaram ,no período final, os repetidos embates dos forwards anta-gônicos, evidenciando grande fadiga. Não mais nos deteremos sôbre o club carioca, por demais conhecido, senão para mencionar as brilhantes defesas de Hydarnés que salvou o seu goal de bem criticas situações. A partida começou às 4,06 hs. da tarde. Procedendo-lhe o toss, quer sorteado com a exigida solenidade, deu ganho de escolha ao Botafogo. Este se colocou do lado direito das arquibancadas. A saída é impelida pelos paulistas, os quais, no principio da pugna, achavam-se possuidores de natural ausência de calma. Por isto, os cariocas encontram a passagem livre para atirar-lhes bons ataques. Morelli mostra-se incerto nas rebatidas. Aos poucos, porém, os do Palmeiras se apossam de seu belo jôgo, até que o desenvolvem à vontade e equilibram o match. De lado a lado observam-se ligeiras investidas. Os ataques e contra-ataques se sucedem, mantendo os espectadores em constante interêsse. Repentinamente, depois de certos episódios capazes de fazer temer a ambos os participantes, a atenção geral é chamada para a área de goal do Botafogo. É que Rolando, num heading infeliz, ao envés de repelir a esfera, passou-a a retarguarda a Demostenes, que bem colocado, sozinho diante do keeper inimigo, perde a oportunidade favorável pretendendo exigir a direção do shoot e dirigindo-o rasteiro a pouca distância do poste direito. Escaparam os cariocas! ... Pouco depois, um lance surpreendente se desenrola. Jones escapa pela extrema-direita e estende um passe longo de meia altura a Benjamin. O inside corria sôbre o goal de Rachou e recebendo o passe encontrou-se em plena liberdade para fazer o goal. O keeper do Palmeira vai ao seu encontro. Benjamin com absoluta presença de espirito faz passar a bola por entre o derradeiro defensor, aninhando-a nas redes opostos. Estava marcado o goal do Botafogo. Formidáveis aplausos estrugem de tôdas as dependências do campo. O Palmeiras não esmoreceu com a aquisição contrária. Continuou a investida com denodo. A partida continuou equilibrada como até a alteração havida no score, e como aliás, se descurdou até o final  Foi o jogo mais equilibrado a que se assistiu este ano no Rio. Os brilhantes ataques dos paulistas dos quais Nazareth não se aproveita, caindo a toda a hora, deviam ser, afinal, compensados. O Botafogo pratica vários corners obrigado pela pressão do Palmeiras. Rachou perpetra linda defesa de um shoot de Benjamin, quando faltavam três minutos para o termino do primeiro meio-tempo, há uma veloz avançada de Nazareth pelo centro. Dutra encontra-se isolado para fazer frente ao center e a Demostenes que corriam a poucos passos um do outro. Carrega o back, em supremo recurso, sôbre o center que se desfaz da bola passando-a à frente de Demostenes. De diminuta distância o inside atira um shoot indefensável. Estava obtido o goal do Palmeiras e ao mesmo tempo, o empate do encontro. 

No segundo meio-tempo o jôgo continuaria equilibrado, a exemplo do precedente. Verifica-se desde logo linda defesa de Hydarnés de um shoot de Nazareth, produzido de menos de um metro. 

Por -sua -vez, Rachou é obrigado a segurar um centro de Pessoa, que lhe foi cair sôbre o goal numa curva de grande diametro. A peleja prossegue insana e a ofensiva muda de campo tão a miudo que é dificil acompanhá-la. A vista não se detem sôbre nenhum deles. Os olhos se movimentam aos seus extremos horizontais, num vai-vem prodigioso. Em determInada emergência um possante kick de Egydio engana os espetadores, dando a parecer-lhes que um goal havia sido conquistado. Ha certa indecisão e dúvida que são logo desfeita por Hydarnés, colocando a esféra no lugar do goal-kick. Por seu lado, Menezes consegue dar um shoot formidável de grande distância, e cujos destino Deus sabe qual seria se não batesse na barra horizontal do goal do Palmeiras, ressaltando à liça. Quatro minutos apenas eram precisos para concluir a partida. O empate era , considerado mais que provável. Entretanto, assim não quiz a Providência. Nazareth, em vigoroso avance, estica um passe a Demostenes que, de um metro, alcança o goal visado, decidindo da emocionante luta. As 5,28 terminava o excelente encontro interestadual, deixando otimamente impressionados os que tiveram a ventura de assisti-lo." 

NOTAS - É preciso esclarecer que J. Martins é Coió (Jorge Martins) e que Pessoa é Gagá (Edgard Pessoa) . Nos dois emocionantes encontros contra o Palmeiras o Botafogo apresentou-se desfalcado, da primeira vez de Rolando, e da segunda, de Villaça, sendo ambos substituídos pelo excelente zagueiro Wigand Joppert que formava com Garlito Rocha, a magnifica parelha de nosso segundo quadro campeão de 1915. No formidável team campeão do Palmeiras, ao lado dos consagrados veteranos Octavio Egydio, Lefevre e Rachou surgiram os novos que encheram de glórias o futebol paulista: Italo, Demostenes. Nazareth e Morelli. 

                                                                     Alceu Mendes de Oliveira Castro 

Acervo particular Alceu Oliveira Castro Jungsted

Fonte: Boletim Oficial do BFR nº 92 de maio de 1950

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